Por Lucas Castro*
Nos últimos anos, o delivery deixou de ser um canal complementar para se tornar parte essencial do varejo brasileiro. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o mercado de delivery movimentou R$ 38 bilhões em 2023, com crescimento entre 7,5% e 8%. Hoje, 56% dos estabelecimentos operam também por canais próprios. Em 2024, o iFood já contava com 380 mil estabelecimentos cadastrados no Brasil.
Paralelamente, 40% dos brasileiros afirmam pedir comida por delivery, sendo que 11% realizam de um a dois pedidos por semana. Em setores como farmácias e supermercados, o uso de aplicativos cresceu ainda mais rapidamente, representando fatias significativas da receita.
Cada venda realizada por meio de aplicativos envolve diversas variáveis: comissões, taxas de entrega, descontos promocionais, campanhas específicas e eventuais cobranças por antecipação. Diante dessa complexidade, a conciliação financeira se torna um processo estratégico — e não apenas operacional.
Imagine um restaurante que fatura R$ 100 mil por mês via iFood. Parte dos pedidos utiliza a entrega da plataforma, com comissão de 20%; outros são retirados no local, com taxa reduzida de 12%; e há ainda pedidos com cupons promocionais, com comissão de 15%. Se o estabelecimento opta por antecipar os recebíveis, há uma taxa adicional de 2%. No fim do mês, os descontos podem ultrapassar R$ 18,5 mil. Qualquer falha de conferência ou falta de visibilidade sobre essas margens pode comprometer o caixa e gerar prejuízos acumulados.
A conciliação financeira, portanto, vai muito além de reunir extratos. Trata-se de um processo estruturado que envolve:
– Comparação diária entre o valor bruto dos pedidos e o total líquido recebido;
– Análise detalhada de cada linha do extrato da plataforma: comissões, taxas de entrega, cupons, antecipações e ajustes;
– Verificação de conformidade com os contratos: cada modalidade (retirada, marketplace, dark kitchen, vouchers) possui regras específicas;
– Registro de falhas e divergências, como cobranças duplicadas, pedidos não repassados, cancelamentos não compensados ou erros nas taxas de antecipação.
Ignorar esses processos é, literalmente, deixar dinheiro na mesa. O varejista perde margem, perde controle financeiro e fica sem respaldo para contestar inconsistências junto às plataformas. Em alguns casos, a falta de controle leva até à desistência de operar nesses canais — o que representa perda de mercado e de oportunidades geradas pela alta demanda dos apps.
A solução não é abandonar o delivery, mas sim profissionalizar sua gestão. Fazer esse controle manualmente se torna inviável quando o canal representa uma fatia relevante da receita. Por isso, a conciliação eficaz depende de sistemas automatizados, capazes de capturar extratos de plataformas como iFood, Rappi e outras, e comparar cada linha com os contratos e os dados de venda registrados pelo varejista. Ferramentas especializadas conseguem identificar inconsistências, auditar valores e garantir que os repasses estejam corretos.
Além da automação, é essencial manter uma rotina disciplinada: conferência diária das vendas, validação constante dos contratos e condições comerciais, histórico estruturado e um fluxo claro de comunicação com as plataformas em caso de divergências. Isso proporciona ao varejista uma visão real da margem líquida por canal, do custo-benefício da antecipação de recebíveis e da viabilidade de participar de campanhas promocionais.
A longo prazo, esse controle se traduz em mais lucro, maior poder de negociação com as plataformas e projeções de caixa mais confiáveis — especialmente para quem depende do delivery como parte relevante do faturamento.
Em resumo: a conciliação financeira deixou de ser uma tarefa operacional para se tornar um instrumento estratégico. Sem ela, o varejista perde recursos, acumula prejuízos e opera no escuro. Quem investe em processos, tecnologia e capacitação ganha segurança, previsibilidade e foco no crescimento.
*Lucas Castro, Chief Revenue Officer da Boavista, referência em soluções automatizadas de conciliação financeira