A contratação de seguros no Brasil ainda segue uma lógica distorcida. Enquanto muitas pessoas não hesitam em proteger seus smartphones no ato da compra, o seguro de vida segue sendo negligenciado, mesmo diante de riscos reais à vida e ao futuro financeiro das famílias. Para a estrategista financeira Cynthya Benevides, de Pernambuco, essa disparidade revela não apenas uma falta de conhecimento, mas também traços profundos da cultura brasileira.
“Geralmente os seguros de aparelhos celulares são oferecidos no momento da aquisição como uma venda casada, o que facilita a adesão do serviço. Já o seguro de vida é um produto menos popular. Muitas pessoas não sabem da sua existência ou da sua finalidade”, afirma.
Segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), houve um crescimento superior a 10% na contratação de seguros de vida no período pós-pandêmico. Ainda assim, o número segue distante do ideal. Para Cynthya, essa escolha não é exatamente uma questão de prioridade, mas sim de desconhecimento.
“Talvez não seja uma questão de prioridade, mas de conhecimento. Por isso é fundamental a função do educador financeiro para propagar essas informações e, assim, salvar famílias do risco da ruína financeira”, afirma.
Ela acredita que a origem do problema começa cedo: na ausência da educação financeira nas escolas. “Certamente, torna-se necessário fomentar e incentivar a educação financeira desde o período pré-escolar até o ensino médio, assim como matérias essenciais como empreendedorismo, primeiros socorros e inteligência emocional. Ainda é muito superficial a aplicação dessas matérias eletivas elencadas na BNCC nas escolas públicas e privadas, além da carência de profissionais capacitados”, aponta.
Essa falta de preparo, aliada a um comportamento social imediatista, hedonista e acelerado, contribui para que o brasileiro fuja de reflexões sobre o futuro. “A adesão por proteções, como seguro de vida, previdência privada e a construção de uma reserva de emergência, não são habituais do brasileiro. Culturalmente, as pessoas se esquivam de um olhar de longo prazo, de planejar o futuro e de pensar na finitude da vida e no ônus financeiro causado para a família com a ocorrência desse fato. Todo mundo vai morrer um dia, infelizmente”, pontua.
Cynthya destaca que o seguro de vida é mais do que um instrumento para casos extremos. Ele é parte fundamental de qualquer planejamento financeiro saudável. “Seguros são proteções, mitigadores de risco e também investimentos de longo prazo. Uma reserva eficiente quando há um imprevisto, pois toda gestão de patrimônio tem risco”, explica.
Ela cita dados comparativos que demonstram o atraso brasileiro nesse aspecto. “Segundo o sócio-diretor institucional da XP e presidente da ANCOR, Rafael Furlanetti, de cada 10 carros no Brasil, apenas 2 são segurados. Nos Estados Unidos, esse número é 7. Seguro empresarial, aqui, são 3 a cada 10. Precisamos inverter essa lógica”, alerta.
No caso do seguro de vida, há ainda benefícios pouco conhecidos pela população. “O seguro de vida, por exemplo, não passa pelo inventário. Ele vai direto para a família do segurado e ainda pode ser usado para custear o próprio inventário. Isso traz paz financeira em um momento de dor, além de proteção patrimonial”, explica.
Entre os principais mitos que impedem a adesão ao seguro de vida estão ideias como “é caro”, “é só para ricos”, “só serve para os dependentes” ou “só vale em caso de morte”. Cynthya rebate. “O seguro de vida pode oferecer coberturas para invalidez ou doenças graves. Um exemplo é a cobertura DIT, que oferece proteção financeira ao segurado que, por motivo de doença ou acidente, precisa se afastar temporariamente de suas atividades profissionais. Isso é especialmente relevante para autônomos e profissionais liberais”, afirma.
A estrategista também destaca o papel do seguro de vida como ferramenta para proteger planos e garantir a continuidade de metas financeiras, mesmo diante de imprevistos. “É papel do estrategista financeiro apresentar o pilar essencial do planejamento financeiro que são as proteções. Entendemos isso como o que vai garantir que você continue no jogo até alcançar seus objetivos, mesmo que algo inesperado aconteça”, resume.
Quando ouve frases como “seguro de vida é dinheiro jogado fora”, ela responde com clareza. “A ideia de pagar por algo que você espera nunca usar pode parecer contraintuitiva. Mas o seguro de vida oferece proteção financeira para você e seus entes queridos. A mágica da vida está justamente na imprevisibilidade, mas sorte ou azar são dois lados da mesma moeda”, cita, referindo-se ao pensador Nassim Taleb.
Para finalizar, Cynthya recorre à sabedoria bíblica, lembrando Provérbios 21:5, que diz: “Os planos bem elaborados levam à fartura, mas o apressado sempre acaba na miséria”. Segundo ela, isso representa exatamente o que o seguro propõe: “Seguros e proteções são como um colete salva-vidas ao longo do caminho. Planejar o futuro financeiro é um ato de sabedoria e responsabilidade”.